Domingo de trocas e brincadeiras de criança – como é bom, como é bom!

Por Renata Franco/ Equipe

Fui convidada a fotografar a feira de trocas de brinquedos que aconteceu no último domingo, dia 25/09, na Praça Schiezaro, que fica na Lapa, aqui em São Paulo. A feira pegou carona com um pic nic comunitário, organizado pelo Movimento Boa Praça em todo último domingo do mês. O Projeto Criança e Consumo apoiou o encontro e lá fui eu fazer o registro dessa manhã de trocas incrivelmente nostálgica.

Cheguei às 10h – quando fazia um sol fresco, desses com sombra fria – e em pouco tempo a praça estava tomada por crianças, pais, emissoras de TV, comidinhas e pelos famigerados brinquedos.

De cara conheci o pessoal do Movimento Boa Praça (gente muito boa praça!) e passei a entender melhor o trabalho deles em prol da revitalização e ocupação das praças públicas – resgatando dessa forma o seu âmago: ser um espaço de encontro, entretenimento, debate e inclusão. Basicamente um resumo do que foi aquela manhã de domingo.

Aos poucos, os pais foram chegando e a exposição dos objetos foi sendo organizada com a ajuda dos pequenos. Os brinquedos eram trazidos por eles, em sacolas dos mais variados tamanhos – umas eram mais pomposas, outras tímidas – mas todas contendo parte importante da curta vida daquelas crianças.

pic nic Enquanto isso, o pic nic era montado e uma faixa era pendurada entre duas árvores com os seguintes dizeres: “Venha conhecer seus vizinhos e ajudar a recuperar nossa praça”. A mesa ia sendo recheada com frutas, bolos, biscoitos e com um pão particularmente especial – feito por um padeiro argentino, que disse ser, aquele, um pão de verdade… Com a mesa quase posta, os olhinhos das crianças (não só deles, confesso) iam se arregalando. Muitos passavam voando, pulando e, espontaneamente, saíam com algum quitute na mão. Não se deparavam com imposições chatas do tipo: não corre, fica quieto, senta que nem mocinha, não vá se sujar!

Viam-se apenas rastros das crianças, que saíam correndo para brincar no parquinho, fuçar os brinquedos alheios, fazer novos amigos, interagir com o meio e se divertir. Foi aí que comecei a entender que a troca de brinquedos, propriamente dita, não era o cerne da experiência.

Muitos deles eram exímios observadores e almejavam encontrar o brinquedo mais legal para tentar uma troca de “sucesso”.

Vi um menino, que carregava uma sacola miúda contendo alguns brinquedos em más condições de uso, mirar umas raquetes de ping-pong estampadas com o nome de uma garotinha. Ficou doido por elas e perguntava pra mim, mostrando o que tinha dentro da sua sacolinha:

–    Será que ela vai querer trocar?

Eu falei:

–    Uai, vai lá falar com ela.

Ele saiu perguntando se alguém conhecia a garotinha e estava notadamente afobado. Encontrou-a brincando no parquinho e, sutilmente, a interrompeu para dizer das qualidades dos seus brinquedos e que a troca seria boa para ambos.

Ela nem o deixou terminar de falar:

–    Eu não trouxe pra trocar. Trouxe pra doar. Pode ficar.

Ele, obviamente, amou o gesto (e eu também) e saiu gritando para os quatro ventos que tinha ganhado as raquetes. E ela, voltou a correr pelo parquinho como se nada tivesse acontecido.

Outra criança estava brincando de amarelinha e catando tocos de madeira, no “andar” de baixo da praça, quando sua mãe o interrompeu:

–    Fulano! Vem aqui que o seu amiguinho quer fazer uma troca com você!

Com certeza o pequeno nem se lembrava de que tinha ido ali fazer a chamada “troca de brinquedos”. Quando chegou, o amiguinho sugeriu a troca entre o trenzinho de madeira (não utilizado pela criança há tempos) e o seu brinquedo artesanal (não faço ideia do nome).

O dono do brinquedo percebeu os olhos gordos do amiguinho, matutou bem e disse:

–    Ah! Não quero trocar não.

O amiguinho saiu decepcionado, mas logo foi tentar engatar outra troca. Enquanto isso, o garoto que há muito tempo nem olhara para aquele brinquedo, pegou o trenzinho e foi brincar feliz da vida, como se fosse a sua mais nova aquisição.

Engraçado como um objeto que se tornou desinteressante e “só mais um” para uma pessoa, pode ser o objeto de desejo de outra. E, que é justamente o desejo deste outro, que desperta novamente seu interesse e dá novos valores e significados ao objeto.

Vem uma amiga, pira nos modelitos e pede um vestidinho que estava quase mofando emprestado. Você empresta e ela fica deslumbrante. A partir daí, um novo interesse é despertado  pela peça (há anos esquecida no ármario) e você não vê a hora de usá-lo novamente. 

Realmente, a ideia do encontro vai além da possibilidade de troca de brinquedos encostados em casa e que não despertam mais o interesse das crianças – seja porque enjoaram, seja porque se tornaram obsoletos ou por qualquer outro motivo que o valha. Sua concepção envolve a ressignificação desses objetos e confirma o pensamento de que as relações não tem que ser, necessariamente, mediadas por objetos ou por relações fugazes de compra e venda.

Eu estava fotografando umas brincadeiras com giz, quando parei para ouvir a entrevista que um garoto estava dando para um repórter. O menino, todo eloquente, estava terminando um raciocínio muito bem articulado quando eu cheguei. E ele dizia assim:

–    “..acho que o grande propósito disso tudo é que haja a união das pessoas.”

No fim, fui elogiá-lo e lhe disse que falava muito bem.

Ele completou:

–    É que eu faço teatro!

Que saudade de ser criança…   

Iniciativas simples como essa devem ser reproduzidas, apoiadas e incentivadas. Pense nisso e leve essa ideia adiante! Reúna os vizinhos e os amigos para um encontro e troque um passeio no shopping ou a programação televisiva da manhã de domingo por um picnic na praça ou até mesmo na área de lazer do seu prédio. Sem dúvida valerá a pena!

Não deixe de ver o registro desse encontro para ter ideia do que foi essa experiência e quem eram essas peças raras.